Na falta de uma cerveja sem álcool, Ângela toma uma Polar sem reclamar, sozinha em casa, coisa rara, tomar uma cerveja sozinha em casa, na cama, ar-condicionado ligado e tudo o que ela precisa por perto. Vida boa, ela agradece ao mundo e ao antidepressivo.
Ângela vive uma tranqüilidade atípica. Tá certo que isto deve fazer uma semana, ou menos, e amanhã alguma coisa pode desabar. Ela tem pouca experiência com a serenidade, mas treinamento de guerra para sobreviver em terremotos. Ângela se educou para enfrentar o pior e sempre desconfiou de alegrias inexplicáveis. Ser feliz é coisa de burro, dizem os desesperançados mais convictos.
Apesar de simpatizar com o sentido da frase, Ângela decretou moratória dos questionamentos existenciais. Pensar menos é mais simples; envolve menos sentimento. Há dias seu sismógrafo interno não registra nenhuma alteração. Melhor evitar qualquer provocação.